Durante a Bienal 2013, passei muito tempo no estande da Gutenberg. E observei, com olhares atentos, uma pilha de livros verdes que parecia evaporar a cada vez que era reposto pelo pessoal que trabalhava ali. Era um livro que me chamou atenção pela capa estrategicamente neutra (no sentido de: não é um livro “de menina” nem “de menino”) e pela sinopse: ‘mutantes + distopia + aventura’. Hm, premissa interessante, pensei. Peguei um livro da pilha, paguei e levei para a autora, que estava ali no estande, autografando.

Foi aí que percebi que, mesmo que o livro fosse ruim (o que não é, de forma alguma), valeria a pena tê-lo comprado apenas por ter conhecido a autora. Impossível não começar a falar sobre esse livro sem falar da idealizadora por trás das páginas, a mega carismática Bárbara Morais. Ela, muito comunicativa e toda empolgada com o lançamento do livro, é uma pessoa incrivelmente gente boa. Estava lá cheia de sorrisos e disposição para assinar quantos livros fossem necessários e tirar quantas fotos fossem possíveis, sem diminuir o sorriso do rosto mesmo com a demanda incrivelmente alta. Depois, é claro, comecei meu processo de stalker e passei a segui-la no twitter, a ler o blog dela e adicioná-la no facebook. Isso só reafirmou a primeira impressão que tive: a Bárbara é sensacional.

Isso posto, vamos ao livro: “A Ilha dos Dissidentes” (ou AIDD, se você estiver com preguiça de escrever tudo) se passa em uma sociedade alternativa onde a humanidade se divide entre seres humanos ‘normais’ e ‘anômalos’. Os anômalos são seres que nascem com mutações genéticas que conferem a eles poderes especiais, como super-força ou habilidade de respirar embaixo d’água. No livro, acompanhamos a história de Sybil Varuna, uma menina que descobre não ser igual aos outros humanos. Sybil é a única sobrevivente do naufrágio de um navio que a levava de Kali – província empobrecida que está no meio de uma zona em guerra entre a União e o Império – para o continente Pacífico, que abriga refugiados escolhidos pelo governo para se verem livres das bombas e do terror.

Resgatada do naufrágio, Sybil percebe que sua vida mudará completamente: sendo uma anômala, ela não poderá voltar para Kali, mas será enviada para Pandora, uma província feita para concentrar anômalos – identificáveis a partir de suas roupas amarelas. Para a protagonista – uma garota órfã de uma região empobrecida e imersa em guerra – a possibilidade de mudança se mostra extremamente satisfatória: de uma hora para outra, ela é adotada por uma família que está feliz em tê-la entre os seus, experimenta pela primeira vez uma quantidade absurda de comidas gostosas; e, também pela primeira vez, consegue se relacionar com amigos da sua idade e firmar amizades verdadeiras.

A princípio, eu tinha torcido o nariz pra esse sentido clean da cidade de Pandora: tudo parece muito fácil para Sybil e meu hábito de leitura sabe que quando a esmola é demais o mendigo desconfia. Mas, aos poucos, fui entendendo que nada do que está ali é gratuito: a verdade é que Sybil sofreu muito na vida e, pela primeira vez, está em um lugar onde não precisa se preocupar com dividir a comida entre almoço e jantar.

A primeira metade do livro se foca mais nesse cotidiano de Sybil e nas relações dela com os amigos, além de possíveis e prováveis interesses amorosos: nesse momento, o enredo se preocupa menos em desenvolver uma história de ação e mais a desenvolver os relacionamentos entre os personagens, o que pode parecer um pouco lento para alguns, mas que para mim funcionou bem.

Sobre os personagens coadjuvantes: são todos muito bem construídos. Destaques para Leon, o anômalo cego que se vira muito melhor do que qualquer outro com visão; Andrei, que disputa com Sybil o posto de melhor-anômalo-da-água; e Ava, uma She-Hulk baixinha e super-forte. Os coadjuvantes são numerosos, mas cada um tem seu momento dentro da narrativa e são perfeitamente cabíveis; não sobra ninguém ali, mesmo que algumas funções sejam mais importantes do que outras.

Outro parêntese é o acerto da Bárbara Morais para a diversidade de etnias e de sexualidades dentro do livro. Temos gente de toda cor e de toda a sexualidade – até mesmo o heterossexual que se veste de mulher para apresentar um programa de televisão –, tudo colocado de uma forma muito natural e acertada, sem forçar barras de inclusão e/ou levantar bandeiras. Uma opção extremamente bem feita que enriqueceu muito a narrativa.

Já na segunda parte da história – depois de um ponto de virada que coloca nossos personagens em uma situação inesperada –, a ação toma conta da narrativa. E ela é frenética, com perseguições, tiroteios, correrias, bombas explodindo e pessoas quase morrendo a todo o momento. Se você estiver achando a primeira parte um pouco morosa e está com preguiça de continuar, meu conselho é: CONTINUE! Se você, assim como eu, é fã de ação, não vai se arrepender ao terminar de ler o livro. As viradas finais são extremamente bem construídas e o último capítulo fecha o primeiro volume da trilogia com uma série de perguntas que serão respondidas (assim espero) nos próximos dois volumes.

“A Ilha dos Dissidentes” é uma aventura daquelas que não dá pra parar de ler. Se você é fã de X-Men ou de quadrinhos de super-heróis em geral, vai se sentir extremamente confortável com a escrita da Bárbara; se não é fã, vai gostar igualmente do livro. Então tire suas roupas amarelas do armário e junte-se aos anômalos!