Fui apresentado ao escritor japonês Haruki Murakami de uma forma bastante curiosa. Nunca tinha ouvido falar dele ou da obra dele até uns meses atrás, quando um tipo de surto murakamiano pareceu atingir boa parte dos meus amigos. Começou com uma pessoa lendo e achando maravilhoso, depois outra fazendo uma resenha aqui e ali e, quando percebi, todos estavam falando sobre Murakami. Não podia ficar de fora da discussão e, curioso que sou, resolvi comprar um livro dele e ver se ele era realmente tudo isso que falam ou se estavam exagerando. A conclusão é que o texto de Murakami é mesmo incrível, e isso se reflete em boa parte dos contos de “Blind Willow, Sleeping Woman” (436 p.).
Acho interessante começar a conhecer um autor tão prolífico quanto Murakami com um livro de contos. É uma oportunidade de fazer um apanhado de tudo aquilo que o autor produziu ao longo de anos - no caso de uma coletânea - ou de tentar descobrir todas as facetas dele, no caso de um livro de contos escrito para ser um livro de contos. Ainda não li nenhum outro trabalho do autor, mas já me sinto familiarizado com o estilo de narrativa dele e com sua linha de escrita. E posso adiantar que ele entra no meu hall de escritores que não pararei de ler, por que é um autor com quem me identifiquei muito ao longo da leitura de todos os contos.
Ler Murakami é um exercício que exige um bom estado de espírito. Já explico: não é que o texto tenha uma linguagem rebuscada ou seja complicado de ler. Muito pelo contrário: o texto é simples, leve, quase como uma fotografia de momento que a gente olha e consegue absorver o sentido dela. No entanto, tal qual uma fotografia, temos que estar atentos aos detalhes para que possamos entender completamente o que está acontecendo ali.
Murakami é bem assim: seus textos são cheios de significados implícitos, e entendê-los torna-se um exercício interessante de ser feito. As histórias de “Blind Willow, Sleeping Woman” tratam de pessoas personagens vivas que parecemos conhecer profundamente, mesmo que passemos apenas alguns minutos com cada uma delas. Vão desde casais no zoológico visitando cangurus até homens de gelo e macacos falantes. O flerte de Murakami com o surreal é sutil e a criação de personagens aparentemente absurdos ou confusos se desfaz completamente quando passamos a conhecê-los. Mesmo que não exista nenhuma explicação, queremos entender porque a mulher do homem de gelo se muda com ele para o Ártico, completamente passiva na situação, bem como nos afeiçoamos ao macaco falante que possui um vício irremediável de roubar os nomes das pessoas que gosta.
Mas falei que o texto necessita de um equilíbrio de espírito. Isso acontece porque todos os contos – ou sua grande maioria – parecem ligados pelo fio tênue e quase invisível da tristeza. Os personagens de Murakami estão todos às voltas com seus próprios fantasmas, sempre tendo de enfrentar situações de perda ou lidar com elas para que consigam se entender consigo mesmos. A solidão é um prato cheio e Murakami sabe lidar bem com todas as oportunidades que esse tema consegue oferecer. Não sei se é uma coisa premeditada ou se esse tema recorrente é reflexo da vida do próprio escritor, mas é possível identificar nas narrativas alguns traços biográficos – o autor chega a ser personagem de alguns dos contos – que parecem confirmar que Murakami é, em maior ou menor grau, um cara cronicamente triste. Não que isso seja ruim ou bom, acho que apenas uma característica (que, mais uma vez, não sei se é real ou premeditada).
Dentre os contos que mais gostei, destaco: Toni Takitani; Dabchick; A “Poor Aunt” Story; The Rise and Fall of Sharpie Cakes; The Mirror; Firefly; Hanalei Bay; The Kidney-Shaped Stone That Moves Every Day. Entre os mais fracos, destaco: Blind Willow, Sleeping Woman; Aeroplane: Or, How He Talk to Himself as If Reciting Poetry; A Perfect Day for Kangaroos. Diferente do que constantemente faço, não irei me estender muito sobre sinopses ou sobre porque gostei ou deixei de gostar de determinada história. O que tenho a dizer é que, como produto final de leitura, temos uma gama de vidas e histórias retratadas de modo humano e genial, com um toque de complexidade que dá vida aos personagens de papel. E que recomendo fortemente a leitura de Murakami para qualquer um, goste de surrealismo ou não, goste de fantasia ou não. Se você gosta de pessoas e de como essas pessoas agem, você deve ler “Blind Willow, Sleeping Woman”.
Bom, eu sou um dos amigos que tem lido Murakami sem parar, então nem preciso falar muito sobre como ele é foda =P Acho que a minha resenha no blog concordou com a tua em muitos pontos, inclusive, principalmente sobre esse traço de tristeza e solidão que permeiam quase todos os contos. Recomendo muito também!
ResponderExcluirA pior parte é que essa tristeza não deixa a gente com aquele nó na garganta - pelo menos comigo não aconteceu -, mas é mais aquilo da gente se identificar com a situação, mesmo que ela seja absurda, e saber que de vez em quando a gente também passa pelas barras que os personagens passam.
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