Gosto quando a fantasia se mistura em um cenário urbano, geralmente escondida dos humanos e cheia de regras que as criaturas mágicas precisam cumprir para não acabarem sendo descobertas pelos comuns. A sensação de pertencimento que esse tipo de literatura traz para mim, como leitor, é maior do que qualquer outro subgênero de fantasia pode proporcionar. Na fantasia urbana, tenho a impressão de que tudo o que acontece na narrativa realmente poderia acontecer na nossa realidade e, por mais absurdo que possa soar, é quase como se eu fosse mais um dos humanos comuns, descobrindo um mundo novo e repleto de possibilidades, de criaturas fantásticas e mitológicas que permeiam nosso cotidiano e que não vejo por simples falta de tato ou, quem sabe, falta de atenção.

Talvez tenha sido por isso que fiquei tão entusiasmado quando li o release de “Storm Front”, primeiro livro da série de sucesso de fantasia urbana “Dresden Files”, do escritor norte-americano Jim Butcher. A série me foi apresentada pelo escritor nacional de fantasia urbana Eric Novello e, depois de muito tempo protelando a leitura, finalmente decidi pegar a coleção e começá-la.

No primeiro volume, somos apresentados ao feiticeiro Harry Dresden. Dresden é o único feiticeiro cadastrado nas páginas amarelas, um consultor particular que pode resolver qualquer sorte de mistérios – e que, é claro, ninguém parece levar muito a sério. Seu passado é um pouco confuso e misterioso e ele parece um daqueles detetives particulares de literatura policial hardboiled, quase como um Phillipe Marlowe menos mulherengo e boca suja, e mais desastrado.

O plot do primeiro livro é um tanto quanto interessante. Dresden é recrutado pela investigadora Karrin Murphy para ajudar na resolução de um crime violento: alguém assassinou um casal de uma forma um tanto quanto cruel, e tudo leva a crer que magia negra foi utilizada no processo. Dresden – que está em um tipo de condicional mágica, o Doom of Damocles, por um crime cometido no passado – deverá ao mesmo tempo provar que ele (lembrem-se, o único feiticeiro registrado nas páginas amarelas) não tem nada a ver com aquele assassinato e tentar descobrir quem matou o casal.

Paralelamente, Dresden é contratado por uma esposa desesperada para encontrar o marido desaparecido. A mulher diz que o homem andava às voltas com magia, e simplesmente sumiu, deixando para trás apenas um talismã em forma de escorpião.

Daí para frente, somos completamente tragados pela história que Jim Butcher nos oferece e apresentados a um rol de personagens interessantíssimos: Johnny Marcone, um figurão ao melhor estilo “Poderoso Chefão”, que tenta dissuadir Harry a continuar com sua investigação; Bob, um espírito enclausurado em um esqueleto, que ensina Johnny a fazer poções do amor à base de dinheiro e tequila; Toot-Toot, uma fada conjurada por Dresden para ajudá-lo na investigação, entre outros.

Talvez a melhor característica do primeiro volume do ‘Dresden Files’ também seja o seu maior ponto fraco: por ser uma história extremamente veloz, muitas pontas ficam soltas. Entendo que algumas tenham sido propositais – afinal, a série já conta 13 volumes e ainda não parece estar no fim –, mas faltaram algumas explicações de caráter mais fundamental, como, por exemplo, qual foi exatamente o crime que Harry cometeu para estar em condicional, qual é o poder de influência do White Council (tipo de órgão regulador de magia no mundo humano) ou qual o objetivo do Nevernever (mundo paralelo onde a mágica é permitida, eu acho. Não há muitas explicações sobre o que de fato seja o Nevernever) em todo o contexto. Tenho certeza de que essas pontas são explicadas ao longo da série, mas fiquei meio rabugento com o fato de algumas delas não serem explicadas imediatamente.

Outro ponto que me deixou um pouco insatisfeito foi o fato das duas histórias paralelas estarem extremamente longes uma da outra. Ora Dresden dá maior atenção à resolução dos assassinatos e parece esquecer completamente do caso do marido desaparecido, ora o contrário acontece. Talvez aproximar um pouco mais as duas histórias – Dresden pensar em um caso enquanto estivesse trabalhando em outro poderia ter sido uma saída – deixasse a trama um pouco mais amarrada.

No fim, temos uma história extremamente divertida de ser lida, que passa rápido (li o livro em dois ou três dias) e te deixa com um gosto de quero mais. À medida que for lendo os outros volumes, postarei minhas impressões aqui, mas tenho certeza que, se os outros livros ambientados no mundo de Harry Dresden continuarem nesse ritmo de narrativa – ou sejam mais aprimorados, como é o esperado de qualquer série ao longo do tempo – ela se justifica como uma das séries de fantasia de maior sucesso da atualidade.

OBS:. Li a edição em inglês da editora Roc, mas sei que a excelente editora Underworld já trouxe esse livro para terras brasileiras. Sob o título de “Frente de Tempestade” e com uma capa maravilhosa, o livro pode ser encontrado nas melhores livrarias do país ou pelo site da editora.